22.2.04

costuro meus próprios agasalhos
com palavras de cor e de lã.
e não há frio no mundo que me tire
o calor de meus casacos.

(e crio fogo e areia nos entrelaces de minh'alma,
que aos poucos vai sendo aquecida por esse amor de palavra que tudo move)

e não há linha melhor para a costura
de quem sonha esperando outras manhãs,
e não há noite que dure eternidade
mesmo quando deveria durar.

mesmo que em meus casacos existam as noites eternas -
as noites trançadas em lã escura nas quais nomeio,
com nomes de meus queridos,
os pontos-estrelas -
nome não há para designá-las fora de suas tramas.

nome também não há
para as coisas que vivem coladas aos sonhos e pele.
as coisas que desejam ser fibra para as linhas de costura.
as coisas que fingem que dormem mas estão tão despertas quanto um pulo.
as coisas que nascem das palavras que nascem do amor que é amor.

então eu nomeio meus casacos,
como esse terno de carinho
que fiz pra você usar
nas noites em que se sentir sozinho.

e acho que é de família:
porque sempre estou a costurar.

em tudo que escrevo, há linha, há ponto, nó.
como minha bisavó,
minha avó,
minha mãe.

mas eu só costuro palavras
e não sou boa nos babados e bicos,
nem nos cortes clássicos e alinhados.

na verdade, este é apenas um agasalho de amor e abraço,
com a única garantia de que nunca ficará poído,
velho
ou mesmo desbotado.

16.2.04

a mão sempre sua.